National Case Study: France’s Maker Response Against COVID-19

Os fabricantes na França se mobilizaram em diversos esforços nacionais paralelos, produzindo mais de 1 milhão de unidades de EPIs em centenas de centrais regionais para os trabalhadores de saúde na França, além de exportar EPIs para ajudar meia dúzia de países no mundo.

A OSMS estudou como as comunidades de fabricantes de diferentes países responderam individualmente à crise. Analisamos como elas resolveram problemas especificamente relacionados às suas características geográficas, de sua sociedade e outros fatores. Apresentamos as conclusões que resultaram dessa análise na forma de estudos de caso nacionais individuais, de forma gratuita, cuja precisão de dados foi analisada pelas respectivas comunidades nacionais de fabricantes. Esses estudos de casos servem como um guia para grupos de fabricantes em países que queiram criar ou melhorar sua coordenação em âmbito nacional.

Histórico

A França é um dos maiores países da Europa, com uma população de 67 milhões.
Imagem: OSMS

A França conta com uma população de 67 milhões de pessoas. Diversas organizações de fabricantes no território do país estão colaborando na resposta nacional de makerspaces contra a COVID-19. Há diferentes tipos de organizações fazendo o trabalho de coordenação nacional: makerspaces, organizações de pesquisa e desenvolvimento, e iniciativas com foco na comunidade, todos trabalhando juntos. Todas essas organizações estão ligadas de forma informal e ocasionalmente fazem conferências de vídeo para compartilhar ideias e trabalhar na otimização de produção e distribuição. 

Somente na França, havia 238 FabLabs na rede francesa do projeto no início da pandemia. Por isso, havia uma rede bem conectada e muitos líderes usaram o Facebook para se comunicarem entre si. Já havia, ainda, uma rede Maker Faire. Existiam diversas listas de correspondência estabelecidas, mas não havia um mapa ou uma coleta adequada de dados, detalhando quantas pessoas tinham impressoras 3D. Nunca houve motivação para que os setores se organizassem em conjunto, por isso, os fabricantes e os FabLabs interconectados existiam basicamente de forma independente. 

Antes da maioria das respostas dos fabricantes, costureiras começaram a trabalhar quase que imediatamente após o início da pandemia. Um médico na França criou um PDF para a produção de máscaras, o promoveu em um canal de rádio e o publicou on-line. O documento se espalhou rapidamente nas comunidades de costura. A notícia alcançou a agência de normas nacionais da França, que publicou uma orientação “caso faça uma máscara, use esse modelo”.

Isso quase chegou a criar um canal de comunicação entre os organizadores de suprimentos médicos de código aberto e o governo francês, mas o governo não deu continuidade ao diálogo com os grupos depois do primeiro PDF de orientação para a fabricação de máscaras. Na semana do dia 18 a 31 de março, diversas iniciativas surgiram quase simultaneamente. Duas linhas de resposta de fabricantes contra a COVID foram estabelecidas: o tipo Raiz e o tipo Preexistente.

  1. A força inicial da maior parte das organizações francesas se deu por meio de seguidores de redes sociais preexistentes e que se tornaram movimentos de raiz:
    • Grupos como Visere Solidaire eMakers Contre le Covid foram as duas primeiras organizações de peso que conseguiram estabelecer uma base de apoio nacional. Eles foram criados por meio de fóruns menores que se expandiram em organizações nacionais e ajudaram a nutrir conexões entre makerspaces e prestadores de serviço de saúde. As organizações usaram primeiro um grupo do Facebook e depois criaram sites próprios. A categoria de grupo de raiz até hoje mantém um estilo de organização descentralizado.
    • Monsieur Bidouille, parte da comunidade maker, usou o grande número de fabricantes dentre seus seguidores no Twitter para criar um fórum chamado Entraide Maker. Assim, ele iniciou uma troca de ideias sobre como a comunidade maker poderia ajudar durante a pandemia. O fórum serviu como um modelo de base para organizações maiores que foram criadas no início da crise.
    • Depois disso, Axelle, do Heliox, canal popular no YouTube, criou guias para criar máscaras e protetores faciais e os disseminou. Isso acabou por levar à criação do projeto Covid3D.
  2. As grandes redes iniciais que se organizaram existiam antes da COVID.
    • Organizações como a rede francesa FabLab já tinha uma rede pré-estabelecida de fabricantes que tinham a capacidade para, quase de imediato, começar a distribuir modelos de EPIs e a facilitar a criação de EPIs por membros da rede.
    • O JOGL (Just One Giant Lab), um fórum que propiciou a comunicação entre profissionais, estudantes e ativistas para trabalharem juntos, criou a Open COVID 19 Initiative, um fórum de código aberto que possibilitou que contribuidores trocassem e discutissem modelos para a criação de novos EPIs, como máscaras e viseiras. O JOGL já tinha uma rede e por isso teve mais facilidade para estabelecer uma iniciativa para a COVID e rapidamente pesquisar e desenvolver novas soluções. Essas empresas think-tank conseguiram se comunicar com makerspeces e passar o contato de laboratórios biológicos, que ofereceram suas instalações para ajudar no teste de diferentes planos e organizações.
    • A MakersNordSud usou redes já existentes da FabLab contendo 6 organizações-membro, abrangendo 8 países do FabLabs da África Ocidental, assim possibilitando a transferência de equipamentos e competências da França para a África, para a fabricação de EPI na região.

A cooperação e colaboração geral entre grupos ocorreu de forma orgânica com o passar do tempo, quando as organizações começaram a criar um reconhecimento entre si, a trocar ideias e estratégias. Mesmo sem uma organização ou administração geral, os líderes dessas organizações realizavam videoconferências frequentes para discutir planos em comum. Grupos do Facebook, com cerca de 5000 a 7000 membros cada, surgiram na França e as pessoas se uniram regionalmente em áreas definidas em um raio de 60 km (veja o mapa para ver esses agrupamentos regionais em “Gerenciamento de Dados” abaixo). Organizações como FabriCommuns, Fablabs, e Visere Solidaire se assemelhavam, já que ajudavam a estabelecer contato entre profissionais de saúde e makerspaces, além de ajudar a propiciar rotas de suprimentos.

Os fabricantes usaram seus relacionamentos com pequenas empresas; A FabLabs usou seus relacionamentos com empresas maiores, e as pessoas se juntaram organicamente para validar modelos com os hospitais o mais rápido o possível. A FabLabs e a JOGL trabalharam e se organizaram juntas, além de usarem o trabalho voluntário de entidades como HelpfulEngineering. Criaram ainda parcerias com inciativas menores como a FabriCommuns.

O Covid3d.org é um projeto criado por hospitais parisienses, que se propõe a ajudar a facilitar a distribuição de impressoras 3D para a fabricação EPIs. Por meio de doações particulares, o projeto conseguiu arrecadar 2.000.000 euros para a compra de impressoras.

O projeto de nome similar Covid3D.fr nasceu das comunidades do Heliox no YouTube e Facebook. Foi uma das maiores iniciativas para a arrecadação de impressoras 3D da França e Europa com quase 10.000 participantes, com uma produção de 200.000 protetores faciais. Devido a mudanças na legislação francesa e requisitos de controle de qualidade mais rigorosos, o projeto foi encerrado permanentemente em junho de 2020.

No caso dos FabLabs franceses, havia um histórico de trabalho colaborativo internacional com uma abordagem humanizada. Por exemplo, eles trabalharam na fabricação de mãos prostéticas para pessoas amputadas, além de outros projetos similares, como a “Human Labs” e “e-NABLE” , por anos antes do surgimento da COVID. Quando o vírus começou a se espalhar, eles começaram a organizar uma equipe no dia 16 de março para atender à crise e produzir dispositivos para salvar vidas. Havia muitos fabricantes individuais fora da rede FabLab e existiu uma tentativa para unir forças. No ápice do projeto, cerca de 1.000 designers estavam trabalhando dia e noite para criar modelos de máscaras, protetores faciais ou qualquer item que pudesse ser de alguma ajuda (incluindo respiradores).

Em escala regional, a certificação logo se tornou viável e esforços foram realizados para organizar uma “fábrica compartilhada” onde impressoras 3D, ferramentas FabLab, e ainda recursos de empresas eram usados em uma rede de fábricas virtuais. O desafio era que alguns dos modelos eram validados apenas regionalmente por meio de hospitais e não podiam ser replicados em outras partes do países por questões legais. 

Líderes da coalizão nacional informal:

Estrutura de gestão e reporte

Uma esquematização da estrutura organizacional do movimento de fabricantes que enfrentaram a COVID-19 em conjunto na França.
Imagem: OSMS

Organizações em âmbito nacional como a Visere Solidaire e a FabLabs ajudaram a atender às demandas de profissionais de saúde e fabricantes. Elas ajudaram a facilitar linhas de suprimento para transportar EPI onde fosse necessário. Em algumas ocasiões, também colaboraram com o exército para fazer a entrega de suprimentos.

A maior parte das organizações operam de forma voluntária ,com indivíduos produzindo quando possível e organizações maiores tentando propiciar o melhor uso e transporte desses suprimentos. Organizações como a Fablabs que tem uma rede mais concreta são melhor organizados em quesito de comunicação e padronização entre makerspaces.

Redes como FabLabs e Visiere Solidere trabalharam mais em âmbito local para encontrar as melhores soluções de distribuição e para definir a demanda mais precisamente. Eles então trabalharam juntos para criar e estabelecer as melhores rotas de suprimento e estrutura organizacional de makerspaces. Em escala nacional, diversas organizações mantiveram uma estrutura informal com várias reuniões entre os líderes das organizações para discutir o estado do movimento e compartilhar ideias para otimizar a produção.

Dentro das organizações em si, a maioria apresenta divisões baseadas nas regiões individuais da França; A FabLabs, por exemplo, tem 234 membros divididos entre 4 conselhos. Cada um desses conselhos tem 15 suborganizações separadas na França que melhor atendem as condições locais dessas áreas. Outras iniciativas, como a Visiere Solidaire, entram em parceria com organizações locais que surgiram nas regiões e redirecionam pedidos e demandas para essas estruturas para assim melhor estabelecer comunicação e organização. Redes como a FabLabs têm um escopo nacional amplo, pois antes da crise já tinham redes e hierarquia preexistentes, que foram usadas para converter os FabLabs do país em mini fábricas de EPI.

Locais como a Visiere Solidaire tem estruturas bem informais, e operam, em certa medida, como um ponto central de comunicação entre redes menores de comunidades de makerspace. No entanto, eles apresentam uma estrutura de reporte, assim como uma forma de gerir algumas iniciativas como, por exemplo, produzir protetores faciais de forma direcionada para países na América do Sul, como foi o caso da Visiere Solidaire. A maior parte da comunicação com a comunidade se deu por meio de grupos do Facebook e do Twitter. A comunicação organizacional interna ocorria no Mattermost, WhatsApp, Grupos do Facebook e Discord.

Gestão de dados

Mapa do COVID Initiative que lista tanto produções francesas como projetos solidários espanhóis de protetores faciais.
Imagem: COVID Initiative
O COVID Initiative também monitora centros de fabricação franceses específicos, em suas responsabilidades regionais, como demonstrado no mapa.
Imagem: COVID initiative

As redes acompanham dados da produção nacional de EPI dentro da suas próprias redes. A Visiere Solidaire já identificou a produção de 900.000 protetores faciais por fabricantes somente na própria organização. Houve o acompanhamento dos números por meio de uma grande planilha gerenciada por Anthony Seddiki (o fundador), que recebia relatórios de subgrupos de toda a França.

O COVID Initiative é, antes de tudo, um projeto de monitoramento de dados entre organizações e até mesmo entre países, impulsionado por uma equipe de 12 pessoas que organizam dados. Por exemplo, eles criaram um mapa de capacidade para a maior parte das impressoras 3D na França, ou um mapa completo de laboratórios na França juntamente com projetos solidários na Espanha. Mapearam, ainda, os diversos afiliados regionais dos 3 maiores grupos de Facebook: A Visiere Solidaire, a Maker Contre COVID e a Visiere 3D.
Makery redigiram histórias sobre diferentes iniciativas para aumentar a conscientização.

A MakersNordSud mapeou os FabLabs e hospitais em 6 países africanos para ajudar os laboratórios a distribuírem EPI assim que tivessem a capacidade necessária. A Visualização de dados foi feita em várias plataformas, mas principalmente em listas personalizadas do GoogleMaps e no CARTO. 

Uma das primeiras visualizações de fabricantes franceses, abrangendo diferentes organizações, feita em um Google Map personalizado.
Imagem: COVID Initiative

Políticas e fatores potencializadores

No início da crise, o grupo geral de organizações entrou em contato com o governo federal pedindo orientações sobre a regulamentação e testagem de máscaras, mas não recebeu resposta do governo, que não foi solícito, por um mês.

Após o ocorrido, eles tiverem interações limitadas com o governo federal e receberam algum auxílio do exército para facilitar o transporte e linhas de suprimento. Isso foi possível em uma região específica do país, onde o exército podia usar seus veículos para se esquivar de restrições de transporte durante o lockdown (a regra proibia que você se afastasse mais de 1 Km da sua casa sem autorização especial). De maneira mais eficaz, as organizações colaboraram com governos locais e serviços de saúde para coordenar a produção e distribuição. Alguns governos municipais providenciaram fundos para que indivíduos criassem “Fábricas Solidárias” ao pagar costureiras locais para fazer máscaras de tecido.

O governo francês forneceu 4 bilhões de dólares no início da pandemia para que grandes fábricas produzisse máscaras e respiradores. Essas entidades industriais não puderam aumentar a produção nos primeiros 30 dias do lockdown. Não era apenas difícil de encaixar no fluxos de trabalho usual, mas havia pouca informação disponível sobre autorização de uso de emergência para EPI em produções de grande escala. É muito provável que o aprovisionamento de pesquisa e desenvolvimento para dispositivos esteja, em alguma medida, relacionado com modelos de código aberto de todo o mundo, que foram testados e validados. No entanto, no início da pandemia, poucos deram devida atenção aos resultados dos subsídios estatais ou do licenciamento de dispositivos médicos que deveriam ser criados e produzidos. 

Quando o governo francês saiu do estado de emergência, limitações rigorosas foram estabelecidas para EPIs produzidos pela comunidade de fabricantes. Na época, grandes empresas de plástico já haviam conseguido autorização para comercializar protetores faciais e outros EPI (em regra, deveria ter demorado 6 meses, mas, pelo caráter emergencial, as aprovações demoraram cerca de 2 meses, em média, para fabricantes comerciais). Agora a demanda foi, em grande parte, atendida por esses grandes fabricantes.

 Os FabLabs e grupos de fabricantes franceses foram agrupados pelo Ministério de Economia para estabelecer orientações para Equipamentos Antiprojeção (em francês “EAP”) e obter autorização para criar modelos e fabricar esses objetos durante o estado de emergência sanitária. Ainda que hospitais tenham oferecido uma validação local de dispositivos médicos, não houve o desenvolvimento de programas oficiais por parte das autoridade em escala nacional.
O ecossistema de P&D, os processos de fabricação de emergência e a logística que se originaram durante a crise com canais multimodais de fabricação (fabricantes, FabLabs, empresas, fábricas) são chamados de “Saúde Aberta” pela liderança do FabLab francês. Há uma busca pelo maior desenvolvimento deste conceito, de forma local, nacional e internacional.

Financiamento

Apenas algumas organizações criaram estruturas de financiamento. A maioria que precisou e arrecadou fundos estava envolvida em pesquisa e desenvolvimento.

O projeto Covid3d dos hospitais parisienses conseguiu arrecadar mais de 2 milhões de euro em doações particulares, que foram destinadas à compra de impressoras 3D para a criação de EPI, dispositivos médicos e outros dispositivos considerados úteis. A MakersNordSud.org tem como objetivo atingir um orçamento de 175.000 para tranferir equipamentos para FabLabs locais no continente africano. Outras organizações como JOGL usaram um sistema de subsídios e parcerias que possibilitavam o acesso de organizações individuais a fundos, para que pudessem criar e testar diversos modelos de máscaras e ventiladores de código aberto.

Links / Imprensa

Read Further Case Studies

Brasil

Apesar dos enormes desafios de infraestrutura, os fabricantes brasileiros organizaram uma resposta nacional descentralizada que resultou em mais de 1 milhão de unidades de EPIs produzidas por centenas de grupos de fabricantes, com uma crescente coalizão em âmbito nacional.

Alemanha

A Alemanha demonstrou resiliência através de uma rede decentralizada de 180 centrais regionais que coordenou mais de 7.000 fabricantes que produziram centenas de milhares de suprimentos durante a pandemia de COVID-19.

Índia

Os produtores na Índia se reuniram na Coalizão Nacional M19 em 42 cidades e vilarejos, fabricando mais de 1 milhão de protetores faciais em 49 dias, ao mesmo tempo em que enfrentavam o desafio de um confinamento muito restrito que complicou as entregas para as unidades de saúde.